Guias de Roteiro
Guias de Roteiro
Ficção Climática
Não precisa ser didático, chato ou forçado. Nem precisa estar no centro da ação ou da história. A emergência climática pode aparecer como um aspecto do pano de fundo, numa subtrama, num personagem. Trata-se de enxergar os projetos sob uma ótica climática e entender de que forma o tema pode aparecer dentro de qualquer história.
Reunimos aqui alguns recursos que podem ajudar roteiristas e autores a encontrar formas de engajar com a crise climática em várias camadas da história. Contando com guias mais completos, como o da Good Energy, rápidos e inspiradores, como o Hollywood Climate Summit Tip Sheet, pensando também na regeneração, como o da Climate Spring.
A maior parte desses recursos é voltada para a produção de obras audiovisuais comerciais para um público amplo. Então, os manuais e outros materiais reunidos aqui dão dicas principalmente em relação ao conteúdo. Não há considerações mais críticas sobre forma nem sobre estruturas narrativas dominantes. Além disso, por serem materiais produzidos no Norte Global, há certas limitações em sua aplicação em outros contextos, como o brasileiro.
Um dos grandes desafios de contar histórias que abordam a crise climática é que a catástrofe, muitas vezes, parece inevitável. É só entrar em contato com as previsões dos cientistas, dados climáticos e notícias sobre o clima que logo nos damos conta do tamanho do problema e somos tomadas pelo medo.
O medo pode ser útil, mas também pode criar aversão ao tema ou paralizar. Sabemos do problema, mas conseguimos, como nos convidaria a bióloga e filósofa Donna Haraway, ficar com ele? Conseguimos imaginar histórias que não só apontam para a crise, mas imaginam e modelam formas múltiplas e generativas de lidar com ela, ficar com ela? Essa é uma das tarefas da ficção climática.
A ficção climática faz parte do guarda-chuva maior da ficção especulativa, que também abrange a ficção científica, fantasia e outros gêneros literários que departem do realismo. Na ficção especulativa, há uma forte ênfase na imaginação; seus autores constroem mundos, sejam eles extrapolações de aspectos já existentes da realidade ou mundos inventados. No caso da ficção climática, a especulação, como o nome já diz, é sobre questões relacionadas ao clima.
É claro que há muita ficção climática distópica, que imagina cenários climáticos futuros extremamente assustadores, mas há também correntes do gênero, como o SolarPunk, SoilPunk e HopePunk, que focam em imaginar futuros em que a humanidade conseguiu, em graus variados e de diferentes formas, responder à crise.
O que esses subgêneros nos oferecem de mais interessante não é uma forma de escapismo ou de projetar O Futuro Positivo Definitivo, mas uma multiplicidade de visões diferentes que fazem frente à narrativa da inevitabilidade da catástrofe. O que elas nos mostram, na verdade, é que não há nada de inevitável sobre o futuro. E que o primeiro passo para futuros menos distópicos é imaginá-los.
Há várias iniciativas que apostam na multiplicidade de olhares para construir essa visão do futuro. O Imagine 2200, da Grist, engaja escritores de todo o mundo para imaginar os próximos 180 anos de progresso climático. O Climate Almanac, organizado pelo Centro de Ciência e Imaginação da Arizona State University, reúne autores de ficção científica com pesquisadores, artistas, cientistas e ativistas de todo o mundo para compartilhar visões positivas de um futuro climático.
Há também publicações que focam em subgêneros específicos, como a TracktorBeam, revista literária dedicada ao Soilpunk, e iniciativas criadas para dar mais prestígio e visibilidade ao gênero como um todo, como o Climate Fiction Prize e o Hope Prize. A curadoria dessas iniciativas tende a focar em futuros regenerativos, onde comunidade, resiliência e conexão são motores para evitar a catástrofe. Que possamos beber dessas fontes para regenerar nossas imaginações e idealizar futuros plurais.
Links citados:
SolarPunk
SoilPunk
HopePunk
Imagine 2200
Climate Almanac
TracktorBeam
Climate Fiction Prize
Hope Prize
Amitav Ghosh
“...a crise climática é também uma crise da cultura, e portanto uma crise da imaginação”

